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terça-feira, 20 de maio de 2014

PROJETO DE LEI PARA REFORMULAÇÃO DO ENSINO MÉDIO



Especialistas questionam 
projeto de lei 
que visa  reformulação
do Ensino Médio



Formação profissional x formação humana






“Um dos pontos negativos da escola é que os professores têm uma visão que o aluno só está em sala para aprender algo para trabalhar, não para ter mais conhecimento. Outro ponto é não ouvir o jovem, só passar a lição e não querer saber nosso ponto de vista sobre o assunto. O espaço escolar é cheio de grades, há três portões para poder entrar. Eu me sinto uma prisioneira, me sinto na prisão”.



O depoimento acima é de Thayná Bernardo da Silva, de 16 anos, aluna do 3º ano de ensino médio de uma escola pública da Zona Sul da capital paulista. O entendimento da estudante de que a escola não serve apenas como porta de entrada para o trabalho também ganha eco entre especialistas que discutem a questão e criticam o projeto de lei da Câmara dos Deputados que leva em consideração a formação profissional em detrimento à formação humana.


A Comissão Especial de Reformulação do Ensino Médio


Criada em 2012, a Comissão Especial de Reformulação do Ensino Médio criou o Projeto de Lei 6840/2013, que muda a forma como a modalidade aparece na Lei de Diretrizes e Bases (LDB) e defende sua jornada em tempo integral, uma nova organização dos currículos, divididos por áreas do conhecimento (linguagens, matemática, ciências da natureza e ciências humanas) e a opção do aluno escolher apenas uma delas no 3º ano e voltar à escola caso mude de ideia. Além disso, o Exame Nacional do Ensino Médio (Enem) passaria a compor até mesmo o histórico do aluno e o ensino profissional já faria parte da formação regular.



Para professores que pensam a educação, no entanto, a ideia não passa de uma desculpa para preencher o vácuo de mão de obra existente no país, deixando de lado a formação humana do estudante, que vai muito além da exigida no mercado de trabalho.


“É preciso pedir mais discussão. Quando pensamos na LDB, que foi aprovada após dez anos de discussão, temos risco do capítulo do ensino médio ser todo modificado”, criticou a professora Sandra Regina Garcia, especialista em políticas públicas da Universidade Estadual de Lavras (UEL-PR), durante seminário promovido pelo Observatório Jovem, da Universidade Federal Fluminense.


Sandra aponta ainda um problema na diversificação curricular do estudante ao chegar ao terceiro ano, quando poderá optar por uma área do conhecimento. “Se ele fizer só um, ele vai continuar seus estudos só nessas área; se ele tiver a possibilidade de ir para o nível superior, só vai poder estudar naquela área que escolheu [na escola]. E se achar que errou na escolha, vai ter que fazer novo terceiro ano, para pensar outra opção”, indica.


Paulo Carrano, professor da UFF e coordenador do Observatório Jovem concorda. “A quem interessa fazer tanta correria e pegar tantos atalhos? O que vemos são atores muito interessados em reduzir a formação humana. A pior coisa é jogar na lata de lixo a formação humana integral conquistada nas diretrizes curriculares, que dão base para um diálogo nacional”.



As relações e o significado da escola


Para o professor Juarez Dayrell, da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), o processo educacional é essencialmente feito de relações, e pensar no jovem é pensar numa categoria relacional. “Existe jovem porque existe adulto, e escola é feita por uma relação intergeracional. É a escola que funda a perspectiva do jovem como sujeito e o coração da escola é a relação professor-aluno. Se essa relação vai mal, o processo de escolarização também vai mal”.



Intitulada “A maior zoeira: experiências juvenis na periferia de São Paulo", a tese de doutorado do professor de Antropologia da Universidade de São Paulo Alexandre Pereira traz um retrato de como as escolas ainda não estão preparadas para lidar com as variadas formas de ser dos jovens. “Pelo que observei nas escolas, o maior desafio da educação no ensino médio está, em primeiro lugar, no modo como essa escola lida ou trabalha com os adolescentes e seus modos de vida. Percebi que havia por um lado a lógica engessada da forma e do tempo escolar e, por outro, as práticas do que os alunos chamavam de zoeira: gozações, brincadeiras e modos de, justamente, driblar essa forma e tempo engessado da escola”.


09/05/2014
Por Julia Dietrich





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